Persuasão

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ANÁLISE DA PERSUASÃO NO DISCURSO SALVÍFICO DO APÓSTOLO PEDRO COM BASE NO TEXTO DE ATOS 2[1]

Resumo: Este artigo apresenta uma breve avaliação do discurso persuasivo de Pedro, discípulo de Jesus Cristo, narrado no livro de Atos dos Apóstolos, da Bíblia Sagrada, com vista na utilização da argumentação cristocêntrica como um mecanismo de linguagem, importante para a persuasão de judeus e gentios no primeiro ano da Era Cristã. Não se trata de aprofundamento teórico, mas uma pesquisa objetiva no sentido de destacar a importância da argumentação fixada na obra redentora de Jesus Cristo para se obter melhor persuasão na pregação da Palavra de Deus. A simplicidade da linguagem do pregador Simão Pedro foi compensada pela ousadia e eloqüência, embora se ressalte no fenômeno da vinda do Espírito Santo, na Festa de Pentecostes, a ação graciosa e soberana de Deus. Em apenas uma pregação houve o convencimento de cerca de três mil pessoas a aceitarem a doutrina cristã. A análise do conteúdo argumentativo utilizado por Pedro servirá para estimular os novos pregadores ao aprofundamento do tema.

Palavras-chave: Bíblia – discurso – argumentação – persuasão

INTRODUÇÃO

Análise da persuasão no discurso salvífico do apóstolo Pedro com base no texto de Atos 2 é um artigo que visa despertar no cristão que atua em liderança em igrejas, para a necessidade de identificar a argumentação no contexto da mensagem aplicada pelo apóstolo Simão Pedro, focando a vida e obra do Senhor Jesus Cristo. Para chamar a atenção do seu público alvo, caracterizado no referido texto de judeus e gentios, Pedro destacou as características de Jesus, sua vida, morte e ressurreição como testemunho da legítima divindade, como sendo Ele, o Messias da promessa.

Considerado como um homem rústico, aculturado, de personalidade forte, e, de pouca paciência, Pedro veio se destacar como o escolhido para liderar o surgimento do cristianismo. Do comportamento temperamental ao homem ousado e de fé inabalável, o discípulo sofreu perseguição, foi martirizado, mas não negou a fé. Resistiu como brava testemunha da vinda de Cristo e propagou a mensagem da cruz que é a propiciação graciosa de Deus em favor da humanidade pecadora.

Já no período pós-ascensão de Jesus, Pedro fixou seu discurso testificando que o Nazareno cumpriu as profecias, sendo destinado para salvar a humanidade, formando uma nova aliança entre Deus e o homem, através da morte expiatória e ressurreição. Trechos bíblicos mostram que o instinto covarde do discípulo, que chegou a negar Jesus, teve uma considerável reviravolta na fase apostólica, tendo demonstrado ser um eficiente pregador e fiel testemunha, que mesmo sob ameaça, não mudou o discurso e permaneceu no cumprimento de seu dever de anunciar as boas novas da salvação.

Graças à eloqüência e coragem do Pedro pregador, milhares de pessoas tomavam decisões após os discursos, e aceitam passar pelo batismo prenunciado por João Batista. A história desse cristão pioneiro é um grande exemplo aos dias contemporâneos para aqueles que lideram igrejas, frente aos ataques do anticristo e da apostasia.

UM BREVE HISTÓRICO DA VIDA DE PEDRO

Simão, filho de Jonas, um pescador que habitava em Cafarnaum. Um homem de personalidade forte e determinada. Foi levado a Jesus por intermédio de seu irmão André, e posteriormente fora escolhido pelo próprio Jesus para compor o grupo de doze discípulos. Apesar de não ser letrado, tinha sabedoria natural que o fazia se destacar dentre os demais. Seu instinto de liderança chamou a atenção do Mestre que o escolheu para ser cabeça numa fase introdutória da Igreja.

Com base na sua personalidade, Jesus passou a chamá-lo de Cefas (equivalente ao latino Pedro) que significa pedra ou rocha. Era assim que Jesus via o amigo. Como um homem duro, porém de caráter moldável, tornando essa dureza em elemento positivo para o exercício da liderança. Tão certo disso, Cristo investiu no aperfeiçoamento do discípulo, vindo a se tornar uma pessoa totalmente diferente, a partir da comunhão com o Espírito Santo.

Testemunhou presencialmente vários milagres de Jesus e aprendeu com Ele os ensinamentos das doutrinas das boas novas. Por ser temperamental e por gostar de desafios, Pedro pôde ser instrumento de milagres, como o fato de ter andado sobre as águas (Mt 14.29). Sua demonstração de fé lhe trouxe o reconhecimento de que Jesus era o Cristo (Mt 16. 16), o Messias prometido e anunciado pelos profetas. O mesmo homem de fé veio a falhar com o Senhor, abrindo brecha para ter seus lábios usados pelo inimigo, a ponto de ter sido repreendido como Satanás (Mt 16. 23).

Nos momentos mais marcantes do ministério de Jesus, Pedro esteve presente. Assistiu a transfiguração (Mt 17. 1) e o marcante momento no Getsêmani (Mt 26.37). Numa atitude em que tentou mostrar fidelidade, cortou a orelha do soldado Malco (Lc 22. 50) no ato da prisão de Jesus, mas foi repreendido porque o coração tinha sido fiel (Mc 14. 68), contudo a atitude foi imprópria. Apesar dos altos e baixos, Pedro se demonstrou também um profundo interessado em conhecer mais a Palavra de Deus e quis saber de Jesus sobre a doutrina do perdão (Mt 18. 21) que se tornou a base de sua teologia. Mesmo tendo negado a Cristo durante o trajeto ao Calvário, Pedro não se deu por vencido e foi o primeiro a entrar no túmulo para certificar o testemunho das mulheres que anunciaram que a pedra que selava a porta do sepulcro havia sido rolada.

Após a ascensão de Jesus Cristo, Pedro tornou-se um homem ousado em sabedoria e atitudes. Recebeu de Jesus Cristo o grande ofício: “Apascenta as minhas ovelhas”, (Jo 21. 15). Liderou os primeiros cristãos em Jerusalém e enfrentou a fúria do Império Romano. Foi um grande pregador da Palavra de Deus e, seus discursos convincentes, enchiam os corações, a ponto de tomarem decisões imediatas ao arrependimento e batismo. Tinha a presença nítida do Espírito Santo em sua vida.

REFERENCIAL TEÓRICO

Se o próprio Pedro se considerava um homem incapaz e sem eloqüência nas palavras que pronunciava, como poderia ter se tornado, repentinamente, um grande pregador? É esse questionamento que nos levou a pesquisar o discurso de Pedro, a partir de Atos dos Apóstolos, capítulo 2, até as duas epístolas I e II Pedro, sendo cartas escritas com exortações e orientações às Igrejas que estavam na Ásia Menor, alvo de falsas doutrinas, ensinadas por falsos mestres. Mesmo considerando a importância de todos os discursos de Pedro, descritos na Bíblia, por questão de delimitação de tema e de conteúdo, neste artigo, estaremos focando o texto de Atos, capítulo 2, entre os versículos 1 a 43 que diz:



1Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar. 2De repente veio do céu um ruído, como que de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam sentados. 3E lhes apareceram umas línguas como que de fogo, que se distribuíam, e sobre cada um deles pousou uma. 4E todos ficaram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que falassem.

5Habitavam então em Jerusalém judeus, homens piedosos, de todas as nações que há debaixo do céu. 6Ouvindo-se, pois, aquele ruído, ajuntou-se a multidão; e estava confusa, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua. 7E todos pasmavam e se admiravam, dizendo uns aos outros: Pois quê! Não são galileus todos esses que estão falando?

8Como é, pois, que os ouvimos falar cada um na própria língua em que nascemos? 9Nós, partos, medos, e elamitas; e os que habitamos a Mesopotâmia, a Judéia e a Capadócia, o Ponto e a Ásia, 10a Frígia e a Panfília, o Egito e as partes da Líbia próximas a Cirene, e forasteiros romanos, tanto judeus como prosélitos, 11cretenses e árabes - ouvimo-los em nossas línguas, falar das grandezas de Deus. 12E todos pasmavam e estavam perplexos, dizendo uns aos outros: Que quer dizer isto? 13E outros, zombando, diziam: Estão cheios de vinho.

14Então Pedro, pondo-se em pé com os onze, levantou a voz e disse-lhes: Varões judeus e todos os que habitais em Jerusalém, seja-vos isto notório, e escutai as minhas palavras. 15Pois estes homens não estão embriagados, como vós pensais, visto que é apenas a terceira hora do dia.

16Mas isto é o que foi dito pelo profeta Joel:

17E acontecerá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda a carne; e os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão, os vossos mancebos terão visões, os vossos anciãos terão sonhos; 18e sobre os meus servos e sobre as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e eles profetizarão. 19E mostrarei prodígios em cima no céu; e sinais embaixo na terra, sangue, fogo e vapor de fumaça.

20O sol se converterá em trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande e glorioso dia do Senhor, 21e acontecerá que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.

22Varões israelitas, escutai estas palavras: A Jesus, o nazareno, varão aprovado por Deus entre vós com milagres, prodígios e sinais, que Deus por ele fez no meio de vós, como vós mesmos bem sabeis; 23a este, que foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, vós matastes, crucificando-o pelas mãos de iníquos; 24ao qual Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da morte, pois não era possível que fosse retido por ela.

25Porque dele fala Davi: Sempre via diante de mim o Senhor, porque está à minha direita, para que eu não seja abalado; 26por isso se alegrou o meu coração, e a minha língua exultou; e, além disso, a minha carne há de repousar em esperança; 27pois não deixarás a minha alma no hades, nem permitirás que o teu Santo veja a corrupção; 28fizeste-me conhecer os caminhos da vida; encher-me-ás de alegria na tua presença.

29Irmãos, seja-me permitido dizer-vos livremente acerca do patriarca Davi, que ele morreu e foi sepultado, e entre nós está até hoje a sua sepultura. 30Sendo, pois, ele profeta, e sabendo que Deus lhe havia prometido com juramento que faria sentar sobre o seu trono um dos seus descendentes -.

31prevendo isto, Davi falou da ressurreição de Cristo, que a sua alma não foi deixada no hades, nem a sua carne viu a corrupção.

32Ora, a este Jesus, Deus ressuscitou, do que todos nós somos testemunhas. 33De sorte que, exaltado pela destra de Deus, e tendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou isto que vós agora vedes e ouvis. 34Porque Davi não subiu aos céus, mas ele próprio declara: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, 35até que eu ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés.

36Saiba, pois, com certeza toda a casa de Israel que a esse mesmo Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo. 37E, ouvindo eles isto, compungiram-se em seu coração, e perguntaram a Pedro e aos demais apóstolos: Que faremos, irmãos?

38Pedro então lhes respondeu: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para remissão de vossos pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo. 39Porque a promessa vos pertence a vós, a vossos filhos, e a todos os que estão longe: a quantos o Senhor nosso Deus chamar. 40E com muitas outras palavras dava testemunho, e os exortava, dizendo: salvai-vos desta geração perversa. 41De sorte que foram batizados os que receberam a sua palavra; e naquele dia agregaram-se quase três mil almas; 42e perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações.

43Em cada alma havia temor, e muitos prodígios e sinais eram feitos pelos apóstolos. 44Todos os que criam estavam unidos e tinham tudo em comum.

45E vendiam suas propriedades e bens e os repartiam por todos, segundo a necessidade de cada um. 46E, perseverando unânimes todos os dias no templo, e partindo o pão em casa, comiam com alegria e singeleza de coração, 47louvando a Deus, e caindo na graça de todo o povo. E cada dia acrescentava-lhes o Senhor os que iam sendo salvos. (ALMEIDA, 1999).

Na primeira parte do texto podemos observar sucessivas teses e questionamentos feitos pelos judeus e gentios que estavam presentes. Foi com base nessas teses que Pedro se levantou para discursar. Diante do mover espiritual surgido nos primeiros cristãos, aqueles que observam perguntavam entre si: “Que quer dizer isto?” (At 2. 12c), e, “Estão cheios de vinho” (At 2. 13b).  A partir daí surgiu o discurso persuasivo de Pedro.

As palavras proferidas pelo apóstolo foram, sem dúvidas, inspiradas pelo Espírito Santo para convencer o homem do pecado. Sua estréia como pregador se deu no instante em que a Igreja estava reunida em Jerusalém e recebeu o Espírito Santo, conforme narrado no livro de Atos, capítulo 2. Frente a uma grande multidão formada por pardos, medos, elemitas, mesopotâmicos, judeus, capadócios, pontos asiáticos e de muitas outras nações e povos, o duro Pedro foi hábil no falar e eloqüente o suficiente para convencer quase três mil pessoas ao arrependimento e batismo.



ANÁLISE ARGUMENTATIVA

Apesar de nunca ter estudado filosofia e nem ser um orador letrado, e muito menos hábil no falar, a postura do apóstolo foi transformadora. Isso mostra que a presença do Espírito Santo é capaz de inundar a vida daquele que abre o coração e se dispõe a fazer a vontade de Deus. De repente, Pedro se revelou como um grande preletor, seguindo critérios de uma oratória eficaz, mesmo sem conhecer a teoria da comunicação e expressão. O autor Almir dos Santos Gonçalves Junior, no livro Quando o púlpito perde o poder (2005), diz que “por meio de convicções profundas, extraídas do perfeito entendimento da Palavra de Deus, pela instrumentalidade do Espírito Santo, é que o ministro do Senhor estará caminhando em prol da mensagem inspirada”, (p.117). Isso demonstra que a essência da boa pregação está ligada a unção do Espírito Santo, porém, podemos enriquecer a explanação na pregação com aplicação de recursos teóricos que favorecem a persuasão.

(...) expressão verbal, a boa fluência da linguagem, sem atropelo das idéias ou imagens, o uso do vernáculo de forma adequada, sem exageros ou excessos, a dicção agradável, a dinâmica da entonação da voz, a interpretação apropriada na euforia e nos gestos daquilo que está sendo dito, a espontaneidade no falar, demonstrando não estar preso a textos ou esboços, e o brilho das palavras pronunciadas. (GONÇALVES Junior, p.79).

O discurso proferido por Pedro seguiu uma estrutura de linguagem em que hoje pode ser considerada a mais eficiente para o convencimento, sendo: apresentou uma tese inicial para prender a atenção, fez uma brilhante introdução, argumentou com muitos artifícios de linguagens no desenvolvimento da mensagem e, fez uma conclusão chamativa à tomada de decisão. Esse processo é a essência de qualquer narração descritiva ou oral.

Antes de especificar cada fase do discurso de Pedro é necessário destacar alguns compostos teóricos da linguagem persuasiva. Assim, estaremos entendendo como foi construída essa eficiência lingüística do discurso do apóstolo. Mesmo não sabendo desse construto teórico, que, aliás, surgiu de forma ordenada séculos depois, Pedro já o utilizou por inspiração do Espírito Santo. O que demonstra que apesar do conhecimento cientifico é necessário ter unção para o convencimento do pecador. Foi o que transbordou em Pedro. A graça estava com ele a ponto de superabundar na eloqüência e convencimento.

Ao falar com aquela multidão citada em Atos 2, Pedro utilizou a retórica que é um composto de mecanismos de linguagens escrito ou oral, em que o indivíduo que emite a mensagem busca convencer um auditório. Trata-se da argumentação coerente com figuras de linguagens.



Retórica – (Do gr. rhetoriké (subentende-se téchne), ´a arte da retórica´, pelo lat. Rhetorica.) S. f. 1. Eloqüência (4); oratória. 2. Conjunto de regras relativas à eloqüência (4). 3. Tratado que encerra essas regras. 4. Adornos empolados ou pomposos de um discurso. 5. Discurso de forma primorosa, porém vazio de conteúdo. (Cf. retórica, do v. retoricar.) (FERREIRA, 1986, p. 1501).

Desse conjunto de regras gera a eloqüência, que é a sensível capacidade de envolver indivíduos numa discussão verbal ou descritiva. É formada por uma construção de discurso envolvente, que visa atrair e estimular um indivíduo ou massa popular, a aceitar ou recusar uma tese. A definição é ampla, tanto quanto a expressão desse saber, pois agrega conhecimentos que vem da comunicação e da expressão, passando por outras ciências que também atribuem ao conjunto construtivo do convencimento. (FERREIRA, 1986).

Muito utilizada em diferentes situações comunicativas e expressivas, a retórica vem se tornando cada vez mais, uma importante aliada à propaganda e publicidade. Governos, instituições, empresas e pessoas recorrem às técnicas mais convincentes como forma de dinamizar o processo de comunicação, na busca de resultados mais satisfatórios. Breton diz que a composição da retórica envolve a argumentação, o raciocínio, a busca de uma ordem do discurso e a manipulação das opiniões e das consciências. Essa seqüência bem fundamentada causa em quem recebe a mensagem, um impacto chamando-o à reflexão tácita que o leva ao conhecimento. Posteriormente surgirá o feedback (resposta ao estímulo de uma informação ou notícia) que pode ser imediato ou não, dependendo do formato de linguagem e seus objetivos. Segundo Breton, “Tudo é argumentável e que o orador é mais um homem de poder do que um homem de ética e de opinião”. (2003, p. 24). Ou seja, se o orador está com o domínio do auditório, assim poderá expor sua tese e defendê-la, quebrando resistência provocando o convencimento.

No caso do discurso de Pedro, as figuras utilizadas foram: o testemunho messiânico de Jesus Cristo e a eloqüência no falar. Pedro falou com autoridade e convicção, levando o auditório a acreditar em suas palavras. Na composição retórica o locutor deve envolver com argumentação suficiente para dar parâmetros de decisão, apresentar um raciocínio lógico, ordenar o discurso de forma a facilitar o entendimento do contexto e manipular as opiniões e consciências voltado-as sempre ao eixo central da mensagem. Se bem aplicada essa seqüência trará facilidade de aceitação. No caso em análise, do discurso de Pedro em Atos 2, a reação do povo foi imediata, mas um feedback nem sempre é instantâneo. A aceitação de uma comunicação pode ocorrer muito tempo depois. O importante é que cada mensagem bem estruturada, com certeza terá algum efeito no momento ou posteriormente.

Na construção da retórica, a argumentação é fundamental. A linguagem deve ser livre, conforme referencia Torben Vestergeard (2000), tendo duas funções, sendo: a expressiva focalizando o emissor, figurando seus valores morais, emocionais e sociais; e a diretiva focalizando a linguagem no receptor figurando os mesmos valores. Foi essa segunda função que Pedro adotou ao chamar a atenção de todos os presentes, testificando a Jesus Cristo, e despertando nos ouvintes a chamada de decisão a partir do convencimento de que foram esses responsáveis pela morte de Cristo. Alertou-os de que apenas com o arrependimento dos pecados poderiam alcançar a graça da salvação. “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para a remissão dos vossos pecados, e recebeis o dom do Espírito Santo”, Atos 2. 38, (ALMEIDA, 1999). Pedro concentrou seu discurso na força da persuasão para que promovesse os resultados desejados, aplicou argumentos convincentes no sentido de que seu auditório pudesse ter parâmetros comparativos para a análise necessária e chegar a uma decisão. Alertou-os de que apenas com o arrependimento dos pecados poderiam alcançar a graça da salvação.

A oratória com maior possibilidade de resultado é aquela que não se estende, porém, não seja tão sucinta a ponto de faltar dados e subsídios informativos. Deve ser na linguagem coloquial para que um maior número de ouvintes possam compreender o contexto, e ser conclusivo com o fechamento da tese inicial. Se bem aplicada, a mensagem completa terá resultado imediato ou pós-discurso. O importante é que o resultado virá.

O pregador Pedro foi criativo em seu discurso ao aproveitar a própria acusação das pessoas presentes ao evento narrado em Atos, capítulo 2, e a partir disso, aproveitando tese já formulada, discursou eloqüentemente. Ser criativo no falar pode ser considerado um dom, pois não existe uma fórmula construída para a criatividade. É natural do indivíduo, vem da bagagem informativa acumulada no saber, da vivência empírica e do raciocínio rápido. A cerca disso, Zeca Martins, conceituado publicitário brasileiro, diz que “(...) a criatividade, conceito bem mais amplo, no entanto, é uma condição inerente à natureza humana, que não se aprende, mas pode ser aprimorada”, (2004, p. 108).

ANÁLISE DO DISCURSO DE PEDRO

De posse desse referencial teórico vamos analisar em partes, de acordo com a ordem natural convencional de um discurso correto, para certificar que o desfecho do que Pedro utilizou no texto bíblico em análise, se segue a fórmula de um bom discurso.                                           

a) Uso da Tese

A tese é a base inicial de um discurso. Deve ser aplicada para que haja um despertar de interesse pelo conteúdo a seguir. Vem geralmente em forma de pergunta direta ou a partir de um tema interrogado e que requer resposta. É um questionamento levantado pelo orador ou pelos ouvintes. Mesmo não sendo conhecedor dessa teoria, por inspiração do Espírito Santo, o discípulo fez bom uso de um questionamento levantado pelo auditório e deu início à sua oratória. Os judeus e demais ouvintes pensavam que os galileus estavam embriagados. “E outros, zombando, diziam: Estão cheios de vinho”, (At 2.13). Pedro aproveitou a tese lançada, o que deu sustentação a sua tese de discurso. Enquanto as pessoas presentes no evento buscavam compreender o que estava acontecendo, onde galileus de origem rural, carregados de sotaques e de limitado teor de linguagem, estavam falando nitidamente os diversos idiomas maternos dos ouvintes, o discípulo de Jesus levantou a discussão trazendo resposta imediata e iniciou uma explicação com base profética de que o fenômeno verificado seria a descida do Espírito Santo.

Estes homens não estão embriagados, como vindes pensado, sendo esta a terceira hora do dia. Mas o que ocorre é o que foi dito por intermédio do profeta Joel: E acontecerá nos últimos dias, diz o senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda a carne; (ALMEIDA, 1999, p. 1273).

Ao apresentar a explicação de que houve ali o cumprimento de uma profecia esperada pelos judeus, o auditório se ateve ao discorrer do discurso.

Mas isto é o que foi dito pelo profeta Joel: E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, que do meu Espírito derramarei sobre toda a carne; e os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão, os vossos jovens terão visões, e os vossos velhos terão sonhos; e também do meu Espírito derramarei sobre os meus servos e as minhas serves naquelas dias, e profetizarão; (At. 2. 16-18).

Joel, considerado pelos judeus um profeta messiânico, seria dentro do argumento de Pedro uma afirmação diretiva capaz de lançar confiança pelas semelhanças, fazendo com que as pessoas presentes passassem a receber Jesus como o Messias profético. Sem dúvida, a aplicação de um trecho de uma profecia amplamente reconhecida, teria chamado a atenção dos ouvintes naquele instante em que buscavam uma afirmação para o evento presenciado.

b) A introdução

A introdução deve ser benevolente, regrada de docilidade e atenção. Apesar do perfil considerado áspero, Pedro começou o seu discurso chamando a atenção de todos os “varões” (tratamento respeitoso dado a homens o que pode ter ajudado a atrair o público), logo no início citou uma profecia muito conhecida pelos judeus, descrita no livro do profeta Joel, capítulo 2, entre os versículos 28 e 32, tendo assim despertado a atenção dos ouvintes. Reinaldo Polito em Como falar corretamente e sem inibições (Saraiva, 1997), afirma que “tornar o auditório benevolente é transformá-lo em um amigo favorável às idéias”, (p. 98). Pedro teria sido benevolente ao dar um tratando respeitoso àqueles que estariam com ironia quanto ao fato. Ainda na introdução, tão logo definiu a tese, alertou a todos que estavam presentes ao acontecimento dizendo, “seja-vos isto notório e escutai as minhas palavras” (At. 2. 14c). Assim, considerou que, o que viria a falar seria tão real e presente quanto ao fato presenciado. A forma de prender a atenção dos homens e o alerta para a legitimidade do fato, sem dúvida, seguiria no discurso com o mesmo afinco. Deixou claro logo no início da preleção que o fenômeno visto teria ligação também com o que foi afirmado por Cristo ao longo de seu ministério terreno.

A introdução deve conter como elemento fundamental, além da benevolência, um direcionamento eficaz, estimulando o público para acompanhar a linha de raciocínio a ser apresentada pelo orador. Ao promover essa aceitação, estará encaminhando suas idéias e informações, subsidiando o público à tomada de decisão.

c) O desenvolvimento da argumentação

A interligação da introdução para o desenvolvimento se faz com uma mensagem de força emocional, aprisionando o ouvinte à cumplicidade de fatos acontecidos naquela época e que traria muita repercussão. VIGIL (2003, p. 143) diz que para a funcionalidade da argumentação se faz necessário no contexto a existência de uma culpa e a existência de um desejo. Na estimulação da vontade pela culpa, o ouvinte se prende na busca de desvendar um esquema conflitante e achar o culpado. No estímulo pelo desejo faz com que o ouvinte contemple que no final do enredo as parte possam se agrupar, unindo-se em vontades e semelhanças. Pedro disse em Atos 2. 22-24:

(...) A Jesus, o Nazareno, varão aprovado por Deus entre vós com milagres, prodígios e sinais, que Deus por ele fez no meio de vós, como vós mesmos bem sabeis; a este, que foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, vós matastes, crucificando-o pelas mãos de iníquos; ao qual Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da morte, pois não era possível que fosse retido por ela. (ALMEIDA, 1999).

Lançou o estímulo de culpa ao dizer que os ouvintes eram cúmplices na condenação, crucificação e morte de Jesus, mesmo sendo testemunhas de milagres e maravilhas, sinais dignos de quem tem unidade com Deus. O mover de culpa deixa o coração contrito e aberto à exortação. Ao falar “(...) vós matastes, crucificando-o (...)” a incisão de culpa atinge vários suspeitos, levando-os ao desdobrar da narrativa. Não bastando, Pedro agregou ao seu discurso mais informações estimulantes para suprir seu auditório. Argumentou dentro de evidências e garantias. Nas evidências colocou afirmações legítimas experimentadas e com resultados comprovados, principalmente os milagres e sinais realizados por Jesus. Nesse caso, os dados devem ser bem checados e validados. Para não correr risco de incompreensão, Pedro testificou através do próprio auditório ao dizer “(...) como vós mesmos bem sabeis (...)”.  Essa afirmação foi a garantia do orador de que narrava uma verdade. A garantia é o que conecta o argumento e as evidências, mostrando relevância evidente para o desenvolvimento da argumentação.

VIGIL (2003, p. 139) em Manual urgente para radialistas apaixonados, considera a existência de três momentos para a construção da argumentação: Onde e quando se deu a ação; personagens principais; e subgênero. No caso citado na referência bíblica estudada o onde e o quando se referiam à própria localidade e ao momento vivido pelo pregador e ouvintes; os personagens principais seriam os hebreus que falavam em outras línguas, isso na visão do auditório, porém, o personagem principal foi apresentado por Pedro como sendo Jesus Cristo, e, o subgênero do fato que ao olhar dos estrangeiros seria a suspense pela incompreensão do que estava acontecendo. Conforme Pedro, o subgênero se tornou em trágico ao considerar os ouvintes como cúmplices da condenação e morte do Messias.

Tendo Pedro preparado o auditório para receber a mensagem, iniciou o desenvolvimento de sua tese, expondo as informações necessárias para a melhor compreensão do desfecho final. Esta é a parte mais importante de um discurso. É nesse contexto informativo que serão lançadas as afirmações buscadas e desejadas pelo público receptor. O apóstolo construiu o desenvolvimento de seu discurso na afirmação messiânica de Jesus, o Nazareno, rejeitado, acusado e condenado à morte pelos judeus. Pedro foi veemente em afirmar que tendo eles matado a Jesus, teriam renunciado um propósito salvívico prometido por Deus e esperado por todos. Ilustrou o desenvolvimento do discurso com a citação feita por Davi, no Salmo 16, que referenciaria a Jesus, o Messias prometido, como um homem incorruptível, vindo de Deus e que poria fim a um sofrimento vivido naquele instante pelo salmista, mas, que, representa o conjunto de sofrimentos dos judeus que poderiam ser imputados na obra redentora desse Messias. Como os judeus viam a morte de Jesus como uma derrota, Pedro passou a afirmar que a morte foi uma conseqüência profética do que haveria de acontecer, mas, que, ao final, a grande dádiva esteve na ressurreição, acontecimento este testemunhado visualmente pelo orador, e transcorrido em diversos testemunhos entre o Império Romano. Ao pregar a ressurreição de Jesus, certificou mais um cumprimento profético de que o messias subiria para à destra de Deus, o Pai, e reinar juntos. A mensagem da ressurreição foi de grande peso para auxiliar o auditório no convencimento e chegar a uma tomada de decisão.

d) O desfecho eficiente do discurso

Após apresentar um conjunto de argumentos evidenciados em profecias respeitadas e pelas comprovações oculares das revelações, Pedro partiu para a conclusão de sua oratória. Mais uma vez, sem ter o conhecimento teórico, porém, dotado de inspiração divina, deu o desfecho da mensagem de forma sucinta e eficaz. A conclusão ideal deve trazer uma recapitulação do fato narrado, ser breve, apresentar variedade de dados informativos com clareza, chamar para uma reflexão, estimulando a platéia para uma ação. A sabedoria incondicional dada pelo Espírito Santo a Pedro formalizou toda essa seqüência em apenas parágrafo narrativo, conclusivo e impactante, sendo: “Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel de que a este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo”, At 2. 36 (ALMEIDA, 1999).

No desfecho, o orador Pedro apresentou as qualificações que são compostas pelas limitações, condições, objeções e mostra de alternativa viável. O foco neste estágio do discurso deve ser voltado aos interesses do ouvinte. É um desfecho contextualizado na narrativa apresentada e auxiliando o ouvinte à compreensão final para seguir para a tomada de decisão.

As limitações apresentadas na oratória condizem com as referências de Joel e Davi, dadas durante a argumentação, afirmando uma promessa redentora acessível a todos os que crêem, conforme Atos 2. 39 “Porque a promessa vos pertence a vós, a vossos filhos, e a todos os que estão longe: a quantos o Senhor nosso Deus chamar”, (ALMEIDA, 1999).

As condições discursadas despertaram no auditório de que o modo em que vivia era uma situação que requereria mudanças. De forma exortativa, Pedro fez com que entendessem que a maneira de ver os fenômenos sobrenaturais precisava mudar, saindo da dúvida para a afirmação da verdade, provados na argumentação. Para se obter resultados uma nova vida era necessária a partir daquele instante em que todas as dúvidas teriam sido explicadas.

A objeção aparece no discurso em At 2. 40c que diz “(...) salvai-vos desta geração perversa”. Todos estavam como pervertidos e precisam entrar numa condição de graça e paz. A inversão de vida daria a salvação messiânica conforme promessas proféticas. Na verdade é o que todos almejavam, porém não tinham discernimento do caminho a ser tomado. O desejo de conversão é uma existência silenciosa dentro das pessoas que precisa ser estimulada.

A alternativa viável veio a partir do questionamento “Que faremos, irmãos?”. Pedro foi veemente em dizer “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo”. O pregador deixou clara a condição de arrependimento para o perdão dos pecados. Somente assim é possível receber a unção do Espírito Santo e contemplar o fruto gerado pela graça, como estavam vendo acontecer com aquele grupo de pessoas.

CONCLUSÃO

Diante do que foi apresentado no referencial teórico, e de acordo com o texto narrado na Bíblia Sagrada, no livro de Atos dos Apóstolos, capitulo 2, podemos concluir que, diante de uma inspiração divina e de posse de um discurso bem estruturado, Simão Pedro, pode apresentar subsídios que suprimiram as duvidas e demais presentes no evento da descida do Espírito Santo sobre a igreja Primitiva, levando-os a profunda reflexão e finalmente à aceitação da confissão dos pecados e arrependimento em Jesus. O resultado foi que num mesmo instante, houve o convencimento de aproximadamente três mil pessoas, que aceitaram passar pelo batismo e seguir a fé cristã.

Podemos afirmar também que, a pregação fixada na obra redentora de Jesus Cristo tem valor na vida das pessoas eleitas e que ainda não tiveram a oportunidade de um encontro salvívico. A ousadia e o desprendimento total para anunciar a Palavra de Deus é, fundamentalmente, para a vida cristã, o dever a ser cumprido diante do propósito confiado a cada membro do corpo de Cristo, a Igreja.

Também é certo afirmar que a Grande Comissão deixada por Jesus Cristo em Mateus 28. 19 é uma obrigação que deve ser cumprida quer seja oportuna ou não, como disse Paulo. O importante é que o Evangelho seja levado a todos os povos de modo que os que crêem e forem batizados serão salvos.

Por fim, cabe ao pregador da Palavra de Deus, manter uma vida consagrada e ungida na presença gloriosa de Deus, através da operação e unção vinda pelo Espírito Santo na vida daqueles que buscam em jejum, oração e retidão. É importante sim, saber ordenar um discurso persuasivo dentro dos parâmetros teóricos aqui fundamentados, mas não podemos deixar de ter a presença do Espírito Santo para que haja o sobrenatural e seja a Palavra viva e eficaz na vida de quem houve e de quem prega.

REFERÊNCIAS

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